Hipnose: uma introdução ao tema.
Written by Adonai Estrela Medrado   
Monday, 30 June 2008 18:20

Sobre

Este material foi originalmente produzido por Adonai Estrela Medrado, Antonio Almeida Carreiro e Yve West Sudré e publicado em 2000 no site http://www.geocities.com/Eureka/Park/2533/curso.htm . A compilação apresentada aqui é apenas uma adaptação desta primeira publicação com poucas alterações.

Introdução

Embora sugestão não seja sinônimo de hipnose, podemos estar certos de que toda e qualquer hipnose começa pela sugestão. O transe hipnótico pode ser definido como o momento em que a sugestão atinge a sua ação mais poderosa, um fenômeno que revela a força do inconsciente que você tem e que está à sua disposição para ser dirigida e controlada por você mesmo em seu próprio benefício, permitindo conhecer, orientar e dirigir o seu pleno potencial e, assim, obter soluções para seus problemas. Sua execução é bem simples e os resultados se aproximam de fatos extremamente compensadores, podendo, em alguns casos, proporcionar efeitos inacreditáveis e até mesmo inexplicáveis.

É através da sugestão que nossa força se acumula e se concentra numa idéia cujo resultado ou tendência é provocar determinado efeito. A sugestão é uma determinante do comportamento humano, pode ser tanto construtiva como destrutiva, impele muitas das nossas ações e a maior parte do resultado de nossa vida é conseqüência dela; desde o desfrutar de sentimentos como alegria, felicidade e paz, até situações negativas como muitas doenças físicas e morais também dela provêm. Mas, situações negativas podem ser reversíveis pelo mesmo processo que se instalam, isto é, o que a sugestão faz, a sugestão desfaz.

A maior parte do nosso poder mental não utilizado é classificado como subconsciente ou inconsciente, cabe a cada um de nós atingir e desenvolver este imenso reservatório de poder latente e, a melhor maneira de chegar ao inconsciente é através de uma das muitas técnicas hipnóticas como a hetero-hipnose e a auto-hipnose, no primeiro caso o hipnotista sugestiona o pensamento de alguém, ao passo que no segundo caso é ele próprio quem o faz. Mas, qualquer autoridade em hipnose dirá que toda hipnose é auto-hipnose e que o hipnotista é simplesmente um guia que influencia, através de técnicas, a força que está dentro do próprio hipnotizado. Uma vez que o indivíduo seja devidamente instruído, ele próprio poderá conhecer, conduzir e controlar a força que está em seu inconsciente.

Histórico

Os fenômenos hipnóticos são até hoje mistificados, isto se deve à sua origem atrelada a fantasias e mistérios. A força da sugestão sempre esteve presente na história da humanidade principalmente em atos religiosos. Algumas práticas religiosas que assistimos e que ganham popularidade a cada dia são na verdade absolutamente idênticas às que praticava, na Alemanha, na segunda metade do século XVIII, o Padre GASSNER. Através da utilização de métodos e aplicações de técnicas hipnóticas, as pessoas eram induzidas a admitir que suas doenças se davam por estarem elas possuídas pelos demônios. Aquele que se sentiam com o diabo no corpo, e por conseqüência doente, vinha ou era trazido ao Padre para que ele o expulsasse e, assim, promovesse a cura.

Franz Anton MESMER, por volta de 1778, espalhou pela Europa o mesmerismo, foi ele, sem dúvida, um dos maiores mistificadores do que viria ser mais tarde conhecido como hipnose. Estudioso da astronomia, MESMER deu uma versão não menos fantástica aos fenômenos hipnóticos do que o Padre GASSNER e, em lugar de responsabilizar o demônio pelas enfermidades, responsabilizava os astros. Os efeitos hipnóticos saíam da explicação religiosa, indo para a explicação da influência astral, tese segundo a qual fluidos invisíveis regulam a vida das pessoas. MESMER cria assim a doutrina do Magnetismo Animal, que foi logo bem recebida por legiões de adeptos.

O magnetismo animal prossegue com o Marquês de PUYSÉGUR, um dos discípulos de MESMER. Conta a história que o Marquês, casualmente, enquanto magnetizava um camponês para curá-lo de dores reumáticas, percebeu que o paciente caía em sono profundo com movimentos respiratórios tranqüilos. Nada havia das clássicas agitações provocadas pelo mesmerismo. PUYSÉGUR percebeu, com surpresa, que o camponês podia falar sem sair do sono hipnótico, e ainda, com lucidez maior que a habitual, indicou o estado de sua própria doença como sendo uma infecção pulmonar e para sua própria cura indicou os remédios precisos, que, aliás, deram resultados. PUYSÉGUR chamou a isso de sonambulismo artificial, e descobriu o estágio mais profundo do transe hipnótico que até hoje é chamado de sonambúlico.

Vários foram os homens famosos que desenvolveram, aplicaram ou transformaram as teorias de MESMER. Mas foi James BRAID, médico escocês, nascido em 1795, quem marcou um grande passo quando usou pela primeira vez, por volta de 1841, a palavra hipnotismo. Deve-se sua iniciação nos estudos da hipnose ao famoso magnetizador suíço LAFONTAINE, este, discípulo de PUYSÉGUR. Em 1843, BRAID publica seu livro sobre o assunto, dizia que a fixação do olhar era o processo para o efeito do sono magnético, batizando inicialmente como sono neuro-hipnológico; neuro acrescido do vocábulo grego hipnos que significa sono. Daí hipnos foi anexado a ismo que significa estudo, dando origem à expressão hipnotismo e, disso foi derivado outros nomes como: hipnose, hipnótico, hipnólogo, hipnotizador e hipnotista.

LIÉBAULT foi quem acrescentou a sugestão verbal à fixação do olhar desenvolvido no método de BRAID. Sua técnica era tranqüila e discreta, baseava-se nas palavras e no tom de voz. Era ele um jovem médico francês que morava em Nancy. Em 1864, lendo um exemplar da obra de BRAID, fez-lhe renascer o interesse pelo assunto que não mais deixaria por toda a sua vida. Seus clientes eram pessoas humildes e camponesas, a eles LIÉBAULT dizia: “Se quiserem tratamentos com drogas, terão que pagar a consulta, mas se permitirem que faça o tratamento pelo hipnotismo, não terão de pagar nada”.

BERNHEIM foi o primeiro a perceber que o estado hipnótico era normal em todas as pessoas e, principalmente, foi quem definiu os efeitos pós-hipnóticos da sugestão como elemento provocador de ações inconscientes e compulsivas e, propôs aplicar isso como terapia. Nesta mesma época, CHARCOT achava que a hipnose era uma forma de histeria, e descobriu que podia induzir sintomas histéricos através de sugestões pós-hipnóticas. Não concordando, BERNHEIM apontou a CHARCOT os seus erros, mostrando-lhe que as características por ele consideradas como critérios de hipnose podiam ser provocadas artificialmente por mera sugestão. Nasceu daí a histórica controvérsia entre as duas escolas de hipnotismo, a do hospital Salpetrière e a da Cidade de Nancy, ambas na França. Estas escolas serviram de base para FREUD e, as investigações com o uso da hipnose forneceram muitas pistas, através das quais ele viria a descobrir o que chamou de inconsciente, dando os primeiros passos na investigação da mente humana, o que lhe permitiu o desenvolvimento da teoria e da técnica da psicanálise.

Da controvérsia entre os seguidores da Salpetrière e os seguidores de Nancy, apareceram eminentes pesquisadores que se incumbiam de tentar compreender e de difundir a hipnose pelo mundo, como KRAFFT-EBING na Áustria, FOREL na Suíça, WETTERSTRAND na Suécia, BRAMWELL na Inglaterra, HEIDNHAIN na Alemanha, FELKIN na Escócia, PAVLOV na Rússia, McDOUGALL e Phineas PUIMBY nos Estados Unidos. Todos empenhados em prestigiar a hipnose, dando-lhe impulso e aplicação terapêutica e, também, recreativa. DONATO e HANSEN, hipnotistas de palco no início do século XX, arrebatavam multidões com demonstrações públicas e proporcionavam grandes espetáculos. Nas platéias, invariavelmente, também estavam presentes importantes personalidades como artistas, médicos, professores e cientistas que, a partir daí, interessavam-se pelo assunto e davam novos impulsos à hipnose.

O público, de modo geral, ainda conserva um temor supersticioso diante dos fenômenos hipnóticos, e as ciências ortodoxas sempre se aproximaram da hipnose com receio e cautela. As tentativas da ciência para explicar a hipnose muito se deve ao cientista russo PAVLOV que também analisou o fenômeno, baseando seu estudo nos reflexos condicionados. Suas hipóteses tentaram enquadrar as explicações sobre o assunto no princípio mecanicista do paradigma científico newton-cartesiano. Contudo, todas as tentativas da ciência neste sentido parecem vagas e imprecisas, sendo assim, seu estudo foi, por muito tempo, abandonado.

O uso da sugestão hipnótica em benefício próprio dá lugar ao conceito conhecido como auto-sugestão ou auto-hipnose, muito difundida na Europa e que entrou em moda nos Estados Unidos durante a década de vinte. BAUDOUIN e PIERCE, entre outros, escreveram sobre o assunto, mas se deve a Emile COUÉ a sistematização desse processo. Foi ele quem formulou vários princípios e leis que fundamentam sua aplicação e desenvolveu frases como: “Todos os dias, de todas as formas, eu estou melhorando cada vez mais”. Esta frase destinada a ser repetida todas às noites, antes de dormir, faz parte do célebre método que ele chamou de “Domínio de si mesmo pela auto-sugestão consciente”. Ele recomendava que as pessoas repetissem frases construtivas, momentos antes de adormecerem. Suas idéias e frases estão, invariavelmente, escritas nos livros de auto-ajuda.

O tema hipnose quando introduzido nas discussões acadêmicas encontra o melhor caminho para difundi-la e desmistificá-la. A Faculdade é o fórum ideal para esse trabalho porque, neste espaço, as apresentações fogem àquele sentido superficial e comum de espetáculo. Seu estudo deve ser claro e baseado, ao máximo, na verdade e nos princípios éticos, morais e científicos, portanto válido pelo sentido útil que se traduz na apropriação do conhecimento teórico e prático revelado nas demonstrações. Nessa oportunidade, não se tem um mero espetáculo de curiosidade, tem-se uma exposição de fatos que são reproduzidos para efeito de aprendizagem, nesta área a capacidade teórica e o desembaraço prático não se adquirem facilmente através de simples leitura.

Terapia

A função terapêutica sempre está presente nas sessões de hipnose, ora explícita, ora subjacente a um ritual ou ao ambiente onde transcorre a indução. Possibilidades de cura existem até mesmo nas demonstrações de hipnose de palco, principalmente quando o transe atingido pelo hipnotizado é de nível médio ou profundo e quando as sugestões produzidas pelo hipnotista representam idéias de bem-estar físico e mental. Porém sua aplicação objetiva para solucionar os mais variados problemas de saúde, dentro de um ambiente médico, tem início em 1864 quando um exemplar da obra de BRAID caiu nas mãos de Auguste LIÉBEAULT, um jovem médico rural francês, que quando ainda estudante adquirira noções de magnetismo mesmeriano. Foi ele o fundador da sugestão sistemática aplicada como tratamento clínico.

Processo Hipnótico

Para alguns autores, o consciente é apenas um processador de informações que são requeridas do inconsciente onde está localizada a grande memória. O consciente é um coordenador que processa a informação do inconsciente e externa de forma psicomotora. Quando alguém entra em hipnose, o consciente diminui de ação, isto é, não processa a memória do inconsciente. Sem ação, o hipnotizado permanece imóvel, em estado cataléptico, até que lhe seja sugerida qualquer atitude ou situação. Neste caso, são as palavras do hipnotista que assumem essa função controladora, capaz de fazer com que o hipnotizado processe a sugestão e a manifeste sem análise, como se as sugestões fossem verdades contidas na sua própria memória.

Para explicar o processo hipnótico, recorremos a um modelo didático, o consciente é a esfera menor tangenciando outra esfera maior, que representa o inconsciente. No ponto de tangência imaginamos uma passagem, como se fosse uma janela, que comunica as duas mentes. Quando o consciente necessita de uma informação, esta seria enviada pelo inconsciente para ser processada e executada pelo consciente que é apenas um coordenador que processa e externa informações memorizadas (arquivadas) no inconsciente.

Imagine que as informações sobre conhecimentos normais só sobem ao consciente quando solicitadas. Isso não acontece com as informações mais fortemente construídas por repetições na história de vida de cada um de nós, são as matrizes, estas rompem facilmente a barreira da janela e sobem despercebidas pelo consciente, e justificam a ocorrência das nossas intuições, geralmente representadas de forma simbólica e inconsciente, mas, são capazes de, compulsivamente, impelir alguns dos nossos comportamentos ou sensações.

Nessa explicação, pela janela que funciona como uma restrição, só passa uma informação de cada vez e quando requerida pelo consciente, embora possa ser o fluxo de informações intenso, dependendo da velocidade do processador. Seria assim explicado o raciocínio rápido ou lento, dependendo do fluxo de informações. Se um indivíduo deseja fazer algo como falar, cantar ou escrever, a informação seria requerida ao grande arquivo e enviada controladamente através da abertura da janela para o coordenador. Essa abertura estaria limitada à capacidade de processamento do consciente.

A partir desse modelo didático pode ser considerada outra hipótese; a de que o método hipnótico possa provocar a expansão da abertura da janela que liga as duas esferas e, neste caso, sobe mais informações do que seria possível o consciente processar (coordenar). Sem capacidade de processamento (coordenação), o consciente tornar-se-ia provisoriamente inativo. A pessoa neste estado não tem qualquer manifestação psicomotora, sendo esta ausência total de movimentos a justificativa para a rigidez cataléptica que pode ser observada no transe hipnótico. Nestas condições, sem ação, o hipnotizado permanecerá imóvel até que lhe é apresentada uma sugestão. Assim, seria o hipnotista o coordenador externo que substitui a inércia do consciente do hipnotizado.

O retorno ao estado normal representa o fechamento da “janela” e a conseqüente regulagem do fluxo de informações da memória. Seria o retorno ao nível da capacidade de processamento do consciente do hipnotizado. Talvez assim se possa explicar muitas das situações presentes no transe hipnótico: a rigidez por exemplo, seria a absoluta falta de coordenação que é uma função consciente. O hipnotizado não dispõe, a menos que lhe seja sugerido, dos sentidos convencionais durante o transe, por isso não dispõe de outiva, não vê e não sente dor. Para isso, depende das sugestões externas geradas pelo consciente do hipnotista.

Na auto-hipnose existiria uma sugestão prévia do próprio hipnotizado, pronta para entrar em ação quando o transe estivesse estabelecido. O mesmo acontece na auto-regressão: de alguma forma, o hipnotizado já sabe, antecipadamente, o que poderá manifestar no transe e, quando a “janela” se abre, ele manifesta. Assim, uma vez no transe, a pessoa manifestará aquilo que ficou anteriormente sugerido como sentimentos de alegria, tristeza, afeição ou ódio ou até assumir outra personalidade.

Esta é, particularmente, a nossa explicação sobre a hipnose, funciona ora de forma subsidiária, ora de forma cooperativa a tudo que se disse sobre o assunto. Não pretende ser um modelo teórico mas simples representação didática de uma possível explicação simbólica do funcionamento da mente humana. Serve talvez para aclarar, sem contestar, outras formas de explicar o complexo fenômeno hipnótico.

Técnicas e Métodos

São muitas as técnicas que facilitam a indução do transe hipnótico, normalmente é comum sua aplicação antes do método e, em alguns casos, uma simples técnica quando bem aplicada é suficiente para produzir até o mais profundo nível de transe. As mais aplicadas são: Técnica da Repetição - Técnica da Contagem - Técnica da Escada - Técnica da Leveza e Respiração - Técnica da Monotonia.

Antes da aplicação dos métodos, é bom verificar alguns detalhes que os antecedem nas induções propriamente ditas, como por exemplo as coisas que se devem e que não se devem dizer nas sessões de hipnose: é de boa ética não falarmos da necessidade do hipnotizável "ter fé", senão apenas da necessidade de "ter confiança". Deve ser dito que, longe de ser uma prova de fraqueza, a suscetibilidade hipnótica exige, isso sim, uma vontade forte, imaginação e sobretudo capacidade de concentração. Deve ser evitado tudo que possa ser interpretado como afronta à sua dignidade cultural ou à sua inteligência.

Um dos temores de quantos ignoram os mecanismos e a natureza da hipnose é a idéia de não acordar e de não voltar ao seu estado normal. Por isso, independentemente da pergunta a esse respeito, convém informar: se eu me ausentar durante o transe, você passará do sono hipnótico para o sono natural, e deste acordará normalmente. Para terminar, explica-se ao interessado, que a hipnose se compara ao momento que medeia entre estar acordado ou estar dormindo, momento este extremamente agradável e repousante. E, concluindo, afirmar-se que as pessoas hipnotizáveis são favorecidas, porque possuem, pelo menos em potencial, condições para serem emocionalmente autocontroladas.

Transe

Se a indefinição teórica da hipnose é evidente, isso não impede que a partir das observações práticas seu estudo não possa ser sistematizado. Alguns autores, levando em consideração a sintomatologia, reconhecem algumas características que permitem dividir o transe hipnótico em níveis diferenciados. Mas, a hipnose é um fenômeno que se explica e se produz, antes de mais nada, em função do hipnotizado, por isso é possível que as expectativas seja em muito variadas tanto para mais como para menos, a depender do indivíduo.

Normalmente, a indução do transe profundo exige de dez a vinte minutos, no entanto, em alguns casos pode chegar a uma hora de trabalho ininterrupto. Pelas reações da pessoa é que o hipnotista avalia a autenticidade e a profundidade do transe. Há pessoas que têm de ser treinadas, alcançando os níveis mais profundos no transcurso de várias sessões. Há os que quase instantaneamente entram em transe profundo.

A unanimidade, os autores concordam que dentre as mudanças fisiológicas que se produzem em conseqüência do nível do transe, figura geralmente uma baixa na pulsação, ocorrendo quedas mais ou menos acentuadas na pressão arterial. Ao iniciar-se o transe, costuma haver uma vaso-constrição, e a esta segue-se uma vaso-dilatação, que se vai prorrogando até o momento de acordar. Equivale a dizer que, no começo, a pressão pode subir um pouco, mas, à medida que o transe se aprofunda, tende a cair. Observa-se geralmente uma mudança na temperatura periférica: variação de calor na testa e no tórax e nas extremidades das mãos e dos pés. A pessoa bem hipnotizada caracteriza-se quase sempre pelas mãos e pés gelados e a testa e o tórax quente, conservando-se geralmente assim durante todo o transe. Não será preciso acentuar que essas mudanças fisiológicas durante a hipnose decorrem largamente das modificações que se produzem no estado emocional do indivíduo. As diferenças de reações nesse particular obedecem a fatores muito sutis, variam também de um indivíduo para outro.

A maioria dos autores ainda divide a hipnose em três estágios ou níveis: 1- hipnose ligeira. 2- hipnose média. 3- hipnose profunda e, genericamente, concordam que nesses níveis ocorrem as seguintes características:

  • Hipnose ligeira, ou superficial: o hipnotizado tem plena consciência de tudo que acontece. Dará e terá, inclusive, a impressão de que nem sequer está hipnotizado. Porém, não sabe explicar porque seguiu corretamente as sugestões do hipnotista.
  • Hipnose média: a pessoa conserva uma lembrança parcial (quase total) do que se passou durante o transe. Não terá dúvida, porém, quanto ao estado de hipnose que experimentou.
  • Hipnose profunda, também chamada estado sonambúlico: costuma ocorrer, entre outras coisas, a amnésia pós-hipnótica. Ao acordar, declara não se recordar de nada do que se passou.

Outros autores são mais precisos quando dividem os níveis em números bem maiores. LIÉBEAULT acreditava em cinco níveis, BERNHEIM em nove, e, DAVIES e HUSBAND, apresentam uma escala com trinta níveis e suas características correspondentes. Le CRON e BORDEAUX apresenta uma escala considerada como a mais completa, dividem o estado hipnótico em seis fases e suas respectivas mudanças fisiológicas espontâneas que se produzem naturalmente durante o transe com cinqüenta diferentes características.

Com base no referencial teórico estudado, principalmente na escala de Le CRON e BORDEAUX e, em observações práticas, foi possível identificar uma seqüência de reações espontâneas e mudanças fisiológicas que ocorrem no hipnotizado durante o transe. Essas situações não são induzidas pelo hipnotista, surgem em conseqüência das fases de 1 a 6 e da numeração de um a cinqüenta que indica o aprofundamento do transe hipnótico:

  1. Insuscetível - Um a dois por cento dos candidatos, embora perfeitamente normais, isto é, não apresentam fatores de inibição ou resistência ao processo hipnótico, como exemplo: portadores de patologias psiquiátricas sérias, incompatibilidade com o hipnotista ou com o ambiente da sessão, etc., e, mesmo assim, também não apresentam reação de espécie alguma. É característica desses candidatos a ausência de toda e qualquer reação aos testes de suscetibilidade.
  2. Hipnoidal - Noventa e oito por cento dos candidatos, quando submetidos à hipnose, mostram uma expressão de cansaço, freqüentemente tremores nas pálpebras e contrações espasmódicas nos cantos da boca e nas mãos. Não obstante os sintomas que apresentam, ainda não é considerado como um transe perfeito. São características dos diferentes níveis que podem surgir nesta fase: 1- tremor das pálpebras; 2- aparente sonolência; 3- fechamento dos olhos; 4- relaxamento físico; 5- relaxamento mental e físico; 6- membros pesados.
  3. Transe ligeiro - Oitenta por cento dos candidatos, quando submetidos à hipnose, começam a sentir os membros pesados e finalmente todo o corpo pesado. Experimentam um estado de alheamento, embora conserve ainda plena consciência de tudo que se passa ao redor. Entre outros sintomas, apresenta-se no hipnotizado a catalepsia ocular, a catalepsia dos membros e a rigidez cataléptica, pouca inclinação a falar. Já não quer mover-se ou mudar de posição. O hipnotizado não tosse, mantém-se sério e imóvel, age como se não estivesse criticamente afetado pelo que acontece no ambiente e a respiração é mais lenta e mais profunda. Neste estágio, o hipnotizado obedecerá às sugestões mais simples, oferecendo, todavia, resistência às sugestões mais complicadas, quando retorna do transe diz que se lembra de tudo que aconteceu mas, declara sempre que, durante o transe, tentou mover-se em vão. São características dos diferentes níveis que podem surgir nesta fase: 7- catalepsia ocular; 8- catalepsia parcial dos membros; 9- inibição de pequenos grupos musculares; 10- respiração mais lenta e mais profunda; 11- lassidão acentuada (sem disposição para se mover, falar, pensar, agir); 12- contrações espasmódicas da boca e do maxilar durante a indução; 13- rapport entre hipnotizado e o hipnotista; 14- sugestões pós-hipnóticas simples; 15- contrações oculares ao despertar; 16- mudanças de personalidade; 17- sensação de peso no corpo inteiro; 18- sensação de alheamento parcial.
  4. Transe médio - Setenta por cento dos candidatos, quando submetidos à hipnose, embora conservem alguma consciência do que se passa, estão efetivamente hipnotizados. Já não oferecem resistência às sugestões, salvo quando estas contrariam seu código moral ou seus interesses vitais. Freqüentemente, nesta fase, o hipnotizado fica com os olhos entreabertos aparecendo a parte branca inferior da córnea. Nesta altura se produzem a catalepsia completa dos membros e do corpo, a amnésia parcial, alucinações motoras, alucinações positivas e negativas dos sentidos, a completa inibição muscular e alucinações cinestéticas. No transe médio já se conseguem efeitos analgésicos e mesmo anestésicos locais, razão por que é o estágio indicado para pequenas cirurgias. Nota-se ainda, uma hiperacuidade em relação às condições atmosféricas (elevada sensação de frio ou calor). São características dos diferentes níveis que podem surgir nesta fase: 19- o hipnotizado reconhece estar em transe, embora não o descreva; 20- inibição muscular completa; 21- amnésia parcial é mais acentuada, lembra-se de quase nada que ocorreu durante o transe; 22- glove anestesia (anestesia das mãos); 23- ilusões cinestéticas; 24- ilusões do gosto; 25- alucinações olfativas; 26- hiperacuidade das condições atmosféricas; 27- catalepsia geral dos membros e do corpo inteiro.
  5. Transe profundo ou sonambúlico - Vinte a trinta por cento dos candidatos, quando submetidos à hipnose, permanecem com os olhos totalmente abertos mas, não aparece a íris (olhos brancos). Se os olhos não estiverem abertos, o hipnotista pode mandar o hipnotizado abrir, isso não vai afetar o transe. Abertos os olhos, podem estar brancos ou apresentam uma expressão impressionantemente fixa, estando as pupilas visivelmente dilatadas. Freqüentemente, nesta fase, o hipnotizado ainda que reaja com maior ou menor presteza às sugestões proferidas pelo hipnotista, sua aparência é a de quem está submerso num sono profundo. É o transe no sentido superlativo do termo. Neste estado, o hipnotizado aceita as sugestões pós-hipnóticas mais bizarras e o hipnotista pode assumir o controle de suas funções orgânicas, influindo por meio de sugestões no ritmo das pulsações cardíacas, alterando a pressão arterial, os processos metabólicos, etc. A regressão de idade, as alucinações visuais e auditivas, negativas e positivas, pós-hipnóticas são outros tantos atributos do transe sonambúlico. A isso pode ser acrescentado a anestesia e, o que é mais importante, a anestesia pós-hipnótica. Os indivíduos submetidos ao transe profundo podem ser anestesiados pós-hipnoticamente. O hipnotista, indicando a região a ser anestesiada, determina as condições específicas como o dia, a hora ou local, quando a anestesia deve produzir efeito. Assim poderá ser submetido à intervenção médica-odontológica, independentemente de novo transe e na ausência do hipnotista. A anestesia hipnótica completa, além de ser um dos fenômenos clinicamente importante, é uma das provas mais convincentes do transe profundo. São características dos diferentes níveis que podem surgir nesta fase: 28- se, de início os olhos não estiverem brancos, o hipnotizado pode abrir os olhos sem afetar o transe; 29- olhar fixo, esgazeado e pupilas dilatadas; 30- sonambulismo, comporta-se como um sonâmbulo; 31- amnésia completa; 32- amnésia pós-hipnótica sistematizada; 33- anestesia completa; 34- anestesia pós-hipnótica; 35- sugestões pós-hipnóticas bizarras; 36- movimentos descontrolados do globo ocular; 37- sensações de leveza, estar flutuando, inchando e alheamento total a tudo que ocorre no ambiente; 38- rigidez e inibição nos movimentos 39- sensação do desaparecimento e a aproximação da voz do hipnotista; 40- controle das funções orgânicas, pulsação, pressão, digestão, ritmo da respiração, resfriamento de parte ou do corpo todo por sugestão; 41 lembrar coisas esquecidas; 42- regressão de idade com absoluta precisão de lembranças de fatos mesmo que ocorridos na fase mais infantil; 43- alucinações visuais e auditivas positivas pós-hipnóticas; 44- alucinações visuais e auditivas negativas pós-hipnóticas; 45- estimulação de sonhos durante o transe ou pós, no sono normal; 46- estimulação de hiperestesias; 47- hiper sensações olfativas, aromáticas e odores.
  6. Transe pleno - Cinco a dez por cento dos candidatos, quando submetidos à hipnose, permanecem com os olhos brancos, boca seca e entreaberta, podem apresentar movimentos descontrolados do globo ocular, um olho move para cima e o outro para baixo, ou ainda, um olho para um lado e o outro em sentido contrário. Apresentam ausência total de reação mesmo quando submetidos a fortes estímulos dos sentidos convencionais como tato, audição, visão e olfato. No entanto, o hipnotizado está profundamente ligado e pronto para executar as sugestões do hipnotista. Pode ocorrer a somatização das sugestões. Encostando-se um objeto frio na pele do hipnotizado e dizendo ser uma brasa, aparece a bolha como se fosse provocada por uma queimadura. É possível sugerir-se ao hipnotizado, ou pode surgir naturalmente sem sugestão específica, o estado de sonambulismo. São características dos níveis que podem surgir nesta fase: 48- inibição de todas as atividades espontâneas, alguns hipnotizados apresentam movimentos descontrolados do globo ocular; 49- somatização das sugestões; 50- ocorrência de fenômenos extra-sensoriais como telecinesia, hiperestesia, clarividência.
Salvo em casos nos quais as mudanças fisiológicas ou as reações indicadas sejam produzidas por efeito de sugestão direta ou indiretamente veiculada pelo hipnotista, estas mudanças devem aparecer de forma espontâneas e correspondem a cada nível de aprofundamento do transe atingido pelo hipnotizado. Mas, dentro desse esquema, tem de se levar em conta as variantes das reações individuais, em alguns casos, características do transe profundo podem apresentar-se em certas pessoas já no transe médio e, até mesmo, no transe ligeiro, ou até não se apresentarem em outras pessoas.
Last Updated on Thursday, 05 May 2011 02:30